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Combate ao trabalho infantil é desafio compartilhado em países de língua portuguesa

 

8/5/2024 – Segundo dados mais recentes da Organização Internacional do Trabalho (OIT), 160 milhões de crianças e adolescentes entre cinco e 17 anos são vítimas do trabalho precoce no mundo. A agricultura lidera esses números, com 70,9% dos casos. Depois vêm os setores de serviços (19,7%) e indústria (10,3%).

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Com realidades diversas nas bases legais e nas estruturas do Estado para enfrentar o problema, países de língua portuguesa lidam com um desafio comum: a naturalização do trabalho infantil, que passa por um viés cultural e de exclusão social. Esse é o tema desta reportagem, a segunda da série especial “Trabalho Decente e Justiça em Países de Língua Portuguesa”. 

O material foi produzido a partir da “1ª Oficina Internacional: Diálogo e Cooperação Sul-Sul de Países da CPLP sobre Justiça do Trabalho”, promovida em março pelo TST e mobilizou representantes do Poder Judiciário de sete Estados-membro da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) e ocorreu em março, na sede do TST. 

Pobreza e aceitação enraizam a prática

“No Brasil, nosso maior desafio é combater a questão cultural da aceitação do trabalho infantil do filho do pobre”, afirma o juiz Otávio Bruno Ferreira, do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (PA/AP). No país, quase 5% das pessoas entre cinco e 17 anos, em 2022, estavam em situação de trabalho infantil, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Isso significa aproximadamente 1,9 milhão de crianças e adolescentes. Pretos e pardos representam 66,3% desse contingente. Dados da OIT apontam que sete em cada 10 vítimas nessa condição trabalham em propriedades rurais ou pequenas empresas da própria família. 

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Em Cabo Verde, país da costa africana, o juiz conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça Simão Alves Santos relata que a tradição é que os filhos devem ajudar os pais no trabalho do campo, nos afazeres domésticos e no comércio informal. “Devido à pobreza das famílias e a essa prática enraizada, tem sido difícil fazer um controle eficaz para a erradicação do trabalho infantil e para manter essas crianças na escola”, afirma.

Em São Tomé e Príncipe, a situação se assemelha: elevadas taxas de desemprego, informalidade e pobreza são entraves complexos de se enfrentar, relata Vera Cravid, procuradora-geral adjunta do Tribunal de Família, Menores e Trabalho.

A Organização Internacional do Trabalho alerta que, apesar da percepção comum de que as famílias são locais seguros, o trabalho infantil nesses casos é frequentemente perigoso. Para se ter uma ideia, mais de 25% das crianças de cinco a 11 anos e quase 50% adolescentes com idade entre 12  e 14 anos em situação de trabalho baseado nas famílias estão sujeitas a condições capazes de prejudicar sua saúde, sua segurança ou sua integridade psíquica. 

Legislação específica e programas sociais são estratégias de enfrentamento

Combater o trabalho infantil exige uma abordagem multifacetada, que envolva políticas públicas eficazes, acesso à educação, conscientização da sociedade e apoio às famílias em situação de vulnerabilidade. Para direcionar o foco internacional nas ações voltadas  para a  eliminação do problema, a OIT instituiu duas convenções: a Convenção 182, que trata das piores formas de trabalho infantil, e a Convenção 138, que aborda a idade mínima de admissão para emprego e trabalho.

Entre os países de língua portuguesa, as duas normas foram ratificadas por Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal e São Tomé e Príncipe. Os países também criaram legislações próprias. 

São Tomé e Príncipe implementou, em 2018, o Código de Organização Tutelar de Menores. O Novo Código de Legislação do  Trabalho, aprovado em 2019, também tem um capítulo destinado ao trabalho infantil, que trouxe inovações que poderão auxiliar o combate à prática e facilitar os mecanismos de fiscalização. “A idade mínima de admissão passou para 15 anos, com escolaridade mínima até a nona classe”, explica Vera Cravid. “Por fim, ela foi incluída na lista das piores formas de trabalho”.

Em Cabo Verde, compromissos internacionais assumidos pelo governo desde 1992 demonstram a preocupação do país com a melhoria do bem-estar das crianças. Por lá, 15 anos é a idade mínima para trabalhar. Mas podem existir exceções em atividades culturais, artísticas, domésticas e agrícolas que não ponham risco seu desenvolvimento, sua saúde e a formação escolar. Mas, segundo Simão Alves, os casos levados ao Judiciário ainda são poucos.

Legislação brasileira é uma das mais completas

Para Maria Cláudia Falcão, coordenadora do Programa de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho da OIT,  o conjunto de leis do Brasil se destaca em relação à proteção de crianças e adolescentes no que se refere ao trabalho. O tema é tratado na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), no Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Trabalhador Adolescente e em programas sociais de transferência de renda. A rede de proteção envolve diferentes esferas de governo e instituições.  

A Justiça do Trabalho brasileira também tem uma atuação institucional voltada ao tema: desde 2012, desenvolve o Programa   de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem. De acordo com o juiz Otávio Bruno, a iniciativa vem enfatizando a aprendizagem como instrumento para a superação do problema. “A educação é a única política pública que o Brasil tem para a inclusão do adolescente no mundo do trabalho de forma segura”, ressalta.

Isso passa também pela necessidade de geração de emprego e renda para as famílias. Algumas iniciativas no país buscam fomentar essas oportunidades. Otávio Bruno cita o projeto Judiciário Fraterno, do Pará, que atende não apenas crianças e adolescentes, mas também as mulheres que cuidam deles. Elas têm acesso a cursos de capacitação profissional e assumem o compromisso de mantê-los na escola e longe do trabalho infantil.

Atuação da Justiça

Desde 2020, a Justiça do Trabalho julgou 1.880 processos envolvendo trabalho infantil na primeira e na segunda instâncias, segundo o Monitor do Trabalho Decente, do Conselho Superior da Justiça do Trabalho. Em junho, em alusão ao Dia Mundial Contra o Trabalho Infantil, comemorado no dia 12, o Judiciário Trabalhista também se mobiliza em mutirões de julgamentos de casos relacionados a trabalho infantil e aprendizagem profissional.

Outra frente em andamento é a elaboração de um protocolo para orientar a atuação da Justiça do Trabalho no julgamento de processos que tratem da temática. O documento deve ser lançado ainda este ano. 

Esforço conjunto e troca de experiências fortalecem atuação dos países

Em 2021, os países da CPLP aprovaram um Plano de Ação para Combate ao Trabalho Infantil nos Estados-membros, a ser executado até 2025. O aprimoramento do conhecimento sobre o tema, o incremento do diálogo para a adoção de políticas públicas efetivas, o fortalecimento da cooperação técnica multilateral e a partilha de experiências estão entre os objetivos do plano. 

A importância dessas trocas foi considerada essencial pelos representantes dos diferentes Sistemas de Justiça e da OIT ouvidos para esta reportagem. Para Maria Claudia Falcão, da OIT, elas permitem identificar as lacunas de abordagens e colaborar com estratégias conjuntas para um futuro promissor e com mais esperança. O desafio, reforça, é global. “Ao olharmos para o cenário internacional, é evidente que estamos diante de um desafio de proporções gigantescas, em que milhões de crianças e adolescentes continuam sendo exploradas e privadas dos seus direitos fundamentais”, conclui. (Andrea Magalhães/NP/CF)

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30/4/2024 –  Trabalho decente: países de língua portuguesa buscam ampliar leis para promover avanços

  

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