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Sexta Turma tranca ação penal contra jornalista que criticou o procurador-geral da República

O Judiciário
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Por não reconhecer o dolo específico de caluniar, injuriar ou difamar, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, decidiu trancar a ação penal contra o jornalista André Fernandes, da revista Carta Capital, que escreveu em 2020 a matéria intitulada “Procurador de Estimação”, com críticas à atuação do procurador-geral da República, Augusto Aras.

A defesa pediu a reforma de acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) segundo o qual o jornalista, ao se referir ao chefe do Ministério Público como “cão de guarda”, “perdigueiro” e “procurador de estimação”, teria configurado, em tese, a vontade de caluniar, difamar e injuriar.

“Admitir simplesmente que críticas dessa natureza caracterizam a imputação de crime, sem a demonstração, por meio de elementos concretos, da intenção deliberada de acusar levianamente, será, a meu sentir, não só banalizar o uso do direito penal, como utilizá-lo como forma de controlar e podar a liberdade da imprensa, hoje garantida constitucionalmente”, destacou o ministro Sebastião Reis Júnior no voto que prevaleceu no colegiado.

Críticas se referem ao exercício de função pública

O ministro observou que todas as críticas feitas pelo jornalista ao procurador-geral da República dizem respeito ao exercício de sua função pública, “em nenhum momento resvalando para o lado pessoal”.

Conforme destacou o magistrado, o caso não envolve um cidadão comum criticando outro cidadão comum, mas foi na condição de jornalista que o acusado assinou a matéria criticando a atuação do procurador-geral, “servidor público federal, figura pública, no exercício de suas funções”, inclusive “quanto ao seu relacionamento com o presidente da República, também servidor público, pessoa que o nomeou para o exercício do cargo”.

No entender de Sebastião Reis Júnior, a matéria publicada tratou “de forma deselegante e agressiva” a atuação de Aras, apontando supostas omissões ou ações impróprias. “Mas se admitirmos que um servidor público de alto escalão não possa ter sua atuação funcional criticada, mesmo da forma que foi no caso concreto, será o mesmo que manter sobre o jornalismo uma ameaça constante de punição, caso as críticas eventualmente tecidas sejam inconvenientes, satíricas, inoportunas ao olhar do criticado”, disse ele.

Para o ministro, a conclusão a que chegou o TRF1 se baseou no exame do teor da publicação, não havendo a análise de outros fatos ou circunstâncias que pudessem levar à conclusão de que os crimes contra a honra imputados ao jornalista foram por ele cometidos.

Livre fluxo de informações

Sebastião Reis Júnior citou precedente da Terceira Seção (HC 653.641) para destacar que o livre fluxo de informações e a formação de um debate público robusto e irrestrito são condições essenciais para a tomada de decisões da coletividade e para o autogoverno democrático.

Na ocasião, a Terceira Seção apreciou possível cometimento de crime por parte de um particular que teria patrocinado outdoors considerados ofensivos ao presidente da República. O colegiado concluiu que o agente público está sujeito a críticas, sem que isso configure crimes contra a honra.

Também citou decisão proferida no julgamento da ADPF 130 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), na qual ficou estabelecido que o exercício da liberdade de imprensa assegura ao jornalista o direito de fazer críticas a qualquer pessoa, ainda que em tom áspero ou contundente, especialmente contra autoridades e agentes do Estado.

Controle das atividades jornalísticas

Ao votar pela concessão de habeas corpus para trancar a ação penal, o ministro afirmou não ter identificado a presença de dolo específico por parte do jornalista no sentido de caluniar, injuriar ou difamar o chefe do Ministério Público. “Vi críticas duras, grosseiras, certamente inapropriadas ou mesmo injustas, mas não a presença de animus injuriandi“, salientou.    

Para Sebastião Reis Júnior, não há como amordaçar, mesmo que de forma indireta, a imprensa brasileira – que tem, segundo ele, exercido um papel fundamental no controle das atividades públicas.

“Admitir ações penais por crimes contra a honra cometidos por jornalistas, pelo simples uso inadequado ou agressivo das palavras e pelo desconforto causado ao criticado, será um passo perigoso para o tão temível controle da atividade jornalística”, finalizou.

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