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Médicos, psicólogos, advogados e gestores públicos reuniram-se no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para debater os desafios que pessoas com espectro autista encontram ao buscarem acesso a direitos básicos, como educação e saúde. O Seminário “10 anos da Lei n. 12.764/2012 (Lei Berenice Piana) – conquistas e desafios, que ocorreu nesta quinta-feira (1/12), também abordou as complexidades na implementação e no cumprimento das políticas públicas estabelecidas em lei sobre a temática.
O advogado e presidente da Comissão Especial de Defesa do Consumidor do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Walter José Faiad de Moura, externou seu incômodo em relação ao descumprimento das leis, a falta de educação sobre os direitos das pessoas, assim como em relação ao preconceito a que pessoas com espectros autistas são expostas diariamente. “Não basta a lei dizer o que vamos fazer; é preciso que haja o reforço da lei. De nada adianta o direito à educação estar no papel se, quando entro em uma escola, vejo o aniquilamento do aluno com espectro autista. Vivemos em uma Esparta, uma sociedade conhecida por não aceitar os desiguais”, disse.
Para o psicólogo Luis Humbert Andrade de Lemos, membro do grupo de trabalho instituído pela Portaria CNJ n. 315/2022, atualmente, a ideia é que a identidade das pessoas com espectro autista seja respeitada e se alcance a melhor qualidade de vida, “com rotinas que sejam dignas de seu cotidiano”. O psicólogo lembrou que, entre os vários desafios educacionais, chegar a uma universidade é um dos mais complexos. “Acessar esses ambientes não é fácil, principalmente porque nesse momento eles já são adultos. Muitas vezes é difícil conseguir adaptar uma turma de faculdade em relação a um colega com essa característica”, afirmou Humbert Andrade de Lemos.
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Outro participante do seminário, o médico psiquiatra Leandro Thadeu Garcia Reveles, especialista em transtorno do espectro autista na infância e adolescência, destacou a dificuldade de acesso aos serviços de saúde para as famílias que possuem crianças ou jovens autistas, tendo como primeiro desafio o diagnóstico. “Faltam profissionais médicos treinados sobre o assunto. Não sabem avaliar nem prescrever tratamento correto. A falta de preparo começa na faculdade e sobra muita opinião e indicação de tratamentos alternativos sem bases científicas”, avalia. O especialista defendeu a Análise do Comportamento Aplicada (ABA) como o tratamento mais indicado, pois permite que seja medida a intensidade e a relevância dos comportamentos da criança para, a partir desses levantamentos, montar estratégica de tratamento especializado e individualizado.
O médico também afirma haver muitas dificuldades para o acompanhamento do autismo no SUS. “A maioria dos Centros de Atenção Psicossociais (Caps) não possui preparo para lidar com o espectro autista. Tratamentos particulares têm alto custo e clínicas credenciadas a convênios estão lotadas ou são de má qualidade. Essa consequência de erros termina em pais desgastados e adultos excluídos, dependentes, muitos deles disruptivos. Alguns sequer conseguem sair de casa”, conta.
No Brasil, há duas linhas de orientação para o atendimento a pessoa com autismo, segundo a coordenadora de Políticas Públicas para o Autismo do estado do Pará, Nayara Barbalho: a linha de atendimento psicossocial (Caps) e os serviços previstos nos centros de reabilitação (CER). Segundo a gestora, são serviços diferentes, que atuam com práticas diferenciadas, e não conversam entre si.
No Pará, com base na Lei Berenice Piana, foram criadas as bases de execução de uma política pública com uma programação intersetorial, a fim de desenvolverem ações voltadas para as pessoas com deficiência. Uma dessas ações foi a retirada do prazo de validade dos laudos que atestavam o autismo. “Não há sentido fazer que as famílias tenham de renovar o laudo a cada três meses de uma condição permanente e que ainda não tem cura”.
No estado do Pará existem os Núcleos de Atendimento ao Transtorno do Espectro Autista (Natea), totalmente embasados em tratamentos com evidências científicas; dos 28 tratamentos, 24 têm como base a ABA. Atualmente, são três unidades no estado. Ainda, um rol de políticas adotadas voltada para capacitação profissional e inclusiva, entre outras ações voltadas a inclusão da pessoa com deficiência também foi apresentado. “A inclusão é a eficácia aos direitos da Constituição viabilizados na prática do cotidiano”, pontuou Nayara.
Representante da sociedade civil, a advogada Elyse Matos, responsável pelo Programa da Organização Mundial da Saúde (OMS) de Treinamento de Pais para crianças com Transtorno Global do Desenvolvimento, implantado na Secretaria de Saúde de Curitiba, exibiu a prática das intervenções comunitárias para apoiar a comunidade local.
O público-alvo são pais em vulnerabilidade social, familiares e cuidadores de crianças de 2 a 9 anos de idade com atrasos no desenvolvimento, principalmente o autismo, ou transtornos no neurodesenvolvimento. Não há necessidade de diagnóstico fechado, e o treinamento é entregue gratuitamente para a população. “É uma a prática que deu certo porque utiliza recursos locais já existentes (há uma capacitação da rede) e é centrado na família”, diz.
“A entidade tem o propósito de eliminar o estigma e os preconceitos que a sociedade possui em relação a pessoas com deficiência por meio do conhecimento e da educação”, diz Elyse. Com base em boas práticas implementadas no mundo, a advogada montou o instituto, a fim de ajudar famílias e cuidadores no cuidado de pessoas com espectro autista. A metodologia é da Organização Mundial da Saúde e baseada em evidências científicas.
A advogada Marlla Mendes e o psicólogo Luis Humbert – que integram o grupo de trabalho instituído pela Portaria n. 315/2022 – mediaram os debates.
Texto: Regina Bandeira
Edição: Jônathas Seixas
Agência CNJ de Notícias
Assista aos debates realizados na manhã desta quinta-feira (1º/12):