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O fórum de Londrina ganhou reforços importantes em seu quadro de servidores. Os novos funcionários têm quatro patas e já encantaram a todos no local. Graças a um projeto inovador do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) em parceria com o Instituto Brasileiro de Educação e Terapia Assistida por Animais (Ibetaa), os cachorros Bello, Snow e Teela tornaram-se os primeiros cães de assistência judiciária do Brasil.
Neste mês de julho, eles foram incorporados como instrumento terapêutico na rede de proteção às crianças e adolescentes vítimas de violência: psicológica, física, abuso sexual ou abandono. Os cães vão colaborar para que elas sejam assistidas e tenham um melhor acolhimento nos atendimentos realizados pela equipe técnica do fórum.
“Queremos fazer um trabalho diferenciado em prol desse público e não ficar naquela coisa burocrática, protocolar. Temos uma expectativa enorme que vai ser muito engrandecedor em relação à concretização dos direitos dessas crianças e adolescentes”, destaca a juíza coordenadora do Núcleo de Apoio Especializado da Direção do Fórum de Londrina, Cláudia Catafesta.
A figura do cão de assistência judiciária existe nos Estados Unidos há 30 anos, mas no Brasil a iniciativa é inédita. Diante de um trauma grande, como um abuso ou abandono, existe uma dificuldade, uma resistência natural das vítimas para ir até o Judiciário e falar sobre o assunto. Os animais estarão ali para, entre outras funções, recepcioná-las, ajudando a humanizar o ambiente do Tribunal e diminuindo a ansiedade das crianças e adolescentes.
“O ambiente forense não é um ambiente agradável para uma criança ou adolescente. Então, o animal é para eles terem vontade de entrar no fórum, se sentirem mais à vontade, diminuir o stress, a angústia, esse medo do momento de falar. Através da aproximação com o cachorro, que eles possam se soltar um pouco mais”, explica a juíza da 1ª Vara da Infância e Juventude da Comarca de Londrina, Camila Tereza Gutzlaff Cardoso.
Como parte da equipe do fórum, os cachorros terão um papel fundamental como facilitadores na criação de um vínculo entre a equipe de psicólogas do TJPR e os pacientes. “O cão é a ponte entre o profissional e a criança, vai aproximá-los. Ele será um suporte emocional para a criança”, diz o fundador e diretor do Ibetaa, Carlos Pires.
Resposta positiva
Os primeiros atendimentos com o auxílio dos animais já resultaram em uma resposta positiva por parte das crianças e adolescentes que tiveram contato com eles. Até cartinhas de agradecimento os cães já receberam.
Treinamento
Com 7 anos, Snow, da raça samoeida é o mais experiente dos cães que já estão atuando no fórum. A dálmata Teela tem 2 anos e o caçula é Bello, de apenas 7 meses. Logo com dois meses de vida, o animal da raça bernese passou por uma avaliação específica que comprovou o perfil para trabalhar como um cão de apoio emocional. A partir disso, uma equipe de especialistas em comportamento animal definiu um plano de treinamento específico. Esse trabalho de aperfeiçoamento é contínuo.
“Não é qualquer cão que pode atuar dessa forma. O animal passa por testes de comportamento para saber se tem o perfil. Depois, outros testes para saber se ele vai dar conta. Não é só porque o cachorro é bonzinho que ele vai virar um cão de assistência judiciária”, salienta Carlos Pires.
“Eles continuam sendo treinados. O adestrador vai com eles ao fórum para que entendam o que tem que fazer, não se distraiam facilmente. Eles vão trabalhar em um ambiente diferente, então também precisam se acostumar”, complementa.
O treinamento não é exclusividade dos cães. Cerca de 30 pessoas do fórum passaram por uma capacitação com profissionais do Ibetaa para que possam aproveitar ao máximo o potencial do trabalho conjunto com o cão de assistência judiciária. Houve uma preparação teórica e depois um acompanhamento prático para o manejo do cachorro.
O esforço da equipe – agora com o reforço animal – tem um objetivo claro: tornar a prestação jurisdicional mais acolhedora para essas crianças e adolescentes.
“A vinda dos cães para a equipe demonstra que o nosso trabalho é muito mais do que só produzir relatórios, uma boa sentença. É perceber que o impacto do Judiciário na vida das pessoas vai além do trabalho formal”, ressalta a juiíza Claudia Catafesta
“O animal muda todo o fórum. Nós mesmos que trabalhamos aqui, ao saber que ele está conosco, um cachorro dócil, nos sentimos acolhidos também”, reforça a juíza Camila Gutzlaff.
Depoimento da psicóloga judiciária Aline Pedrosa Fioravante:
“Ouvir judicialmente meninos e meninas relatarem os mais diversos tipos de violências sofridas é um desafio profissional que tenho experienciado há aproximadamente 4 anos. O preparo técnico e os instrumentos utilizados são anteparos que me oferecem relativa segurança na condução da audiência de depoimento especial, mas muito do que acontece neste momento foge à alçada técnica e diz respeito ao mundo subjetivo, por vezes intangível, da criança e do adolescente ouvidos.
Há o que não se diz, o que se apaga da memória, o que a dor cala. Existe a palavra e um universo que a palavra nem sempre alcança. Falemos um pouco deste lugar. Ontem pude testemunhar a experiência do Cão de Assistência Judiciária na recepção da adolescente que veio ao depoimento especial. Uma menina à flor da pele e um cão assistente que, ao repousar a cabeça em seu colo, soube dizer mais do que eu poderia. Ao trocarem olhares, se encontraram naquele lugar que nada se diz e tudo se entende. Ao brincarem com os truques divertidos, compartilharam alegrias e sorrisos que eu não poderia oferecer.
Ontem, como tantos dias, foi um dia de falar sobre dores, sobre traumas, mas foi um dia em que isso aconteceu de um jeito diferente, e eu sou muito grata por ter a Teela como apoio na oferta de um atendimento mais acolhedor.
Não tenho dúvidas do impacto positivo do Cão de Assistência judiciária sobre a menina que conseguiu, apesar de tudo, sair sorrindo deste fórum. Não tenho dúvidas de que, juntamente com todas as medidas técnicas a serem adotadas, há um universo infinito de possibilidades para que os cães apoiem nossos meninos e meninas em seus momentos mais difíceis, naqueles lugares em que nossas palavras não alcançam e nossos sentidos venham a falhar.”
Fonte: TJPR