O cuidado com a saúde de magistrados e servidores precisa de investimentos, tanto financeiros quanto de atenção para a elaboração de programas estruturados. Para atender essas questões, os tribunais trabalham na implantação da Política de Atenção Integral à Saúde de Magistrados e Servidores do Poder Judiciário, observando a gestão orçamentária e o cuidado, inclusive, da saúde mental no período pós-pandêmico.
As orientações estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em relação à saúde suplementar e a interiorização da atenção à saúde foram discutidas durante o 5º Webinário sobre a Política, realizado nessa segunda-feira (11/9). Os palestrantes destacaram as dificuldades de implantação da Resolução CNJ n.294/2020, que regulamenta o programa de assistência à saúde suplementar para esse público.
A norma autoriza a prestação de serviços suplementar de saúde por meio de autogestão, contrato com operadoras de planos de saúde, plano próprio do tribunal ou por auxílio indenizatório, por meio de reembolso. Nessa última hipótese, a Resolução CNJ n. 500/2023, alterou o percentual mínimo de reembolso de 10% para 15%, para os casos em que o tratamento seja destinado a pessoa com deficiência ou se o usuário tiver mais de 50 anos de idade.
Para Carlos França, presidente do Conselho de Presidentes dos Tribunais de Justiça do Brasil (CONSEPRE), essas mudanças representam um impacto significativo para a gestão orçamentária das cortes. De acordo com ele, por mais que haja o esforço em se cumprir a política, a Justiça Estadual esbarra nas negociações com os legislativos locais para fazer alterações no orçamento do tribunal. “A estrutura do Judiciário consome uma parte considerável de seu orçamento. Qualquer aumento resultará em remanejamento orçamentário”, destacou.
França disse ainda que interiorização de serviço médico também demanda custos que não são viáveis em algumas regiões, além de não ter profissionais de especialidades variadas para tanto. Ele informou que a Justiça Estadual está presente em quase três mil comarcas, mas a prestação de serviço de saúde organizado restringe-se, na maioria dos lugares, às capitais. “Recorremos a essa estrutura para realizar as campanhas e ações, mas a regionalização é difícil tanto pela questão financeira, quanto pelos recursos humanos”, frisou.
Presidente da mesa, a juíza do Tribunal Regional do Trabalho da 20ª Região e ex-conselheira do CNJ Flávia Moreira Guimarães Pessoa ressaltou que as condições de serviços de saúde ofertadas são distintas no país. “Por isso, a importância do reembolso: o plano de saúde também sofre impacto com as diferenças regionais e pode não conseguir atender à demanda. O importante é que nosso público tenha esse atendimento quando necessário”, pontuou.
O conselheiro do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) Jayme de Oliveira contou que o órgão seguiu as diretrizes do CNJ ao elaborar sua própria Política de Saúde Integrada. De acordo com ele, o modelo de limite indenizatório estabelecido pela resolução – e seguida pelo CNMP – permite um alcance maior nos índices de reembolso, “explicável pelas diferenças dos planos oferecidos no Norte e Nordeste e nos grandes centros no Sudeste, que são muito mais caros”.
Para ele, que também já foi presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), é preciso priorizar o investimento na Política de Saúde. “Dessa forma, supera-se a dificuldade para que toda a magistratura tenha a equivalência, a paridade, vencimentos iguais para todos, reembolsos iguais, direitos iguais. A magistratura é uma. E a Política pretende que todos possam receber os mesmos valores”. Ele destacou também que se vive uma situação paradoxal, porque o Judiciário foi pioneiro na política e inspirou o Ministério Público, mas este avançou comparativamente muito mais rápido no alcance das coberturas e na extensão delas aos membros e servidores. Contudo, as alterações introduzidas recentemente pelo CNJ e pelo seu Comitê de Saúde caminham com muito acerto exatamente na direção de reduzir esse descompasso e suprir as carências inclusive para servidores e Magistrados das Comarcas do interior, particularmente com a implementação do mecanismo de ressarcimento de despesas não cobertas pelos planos dos Tribunais.
Saúde mental
Quanto à proteção à saúde mental de magistrados e servidores, o desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região Sebastião Geraldo de Oliveira destacou que é preciso ter boas estratégias de prevenção. Ele apontou que os transtornos mentais são o terceiro grupo de afastamento pelo INSS, desde 2019, sendo superado apenas por lesões e acidentes típicos, e por Lesões por Esforços Repetitivos (LER) ou Distúrbios Osteomusculares Relacionadas ao Trabalho (DORT). Entre os transtornos mentais, os dados mostram ainda que, entre 2020 e 2022, depressão, ansiedade e estresse são os principais motivos de afastamento.
Em números globais, a Organização Mundial da Saúde (OMS) registrou que, em 2019, 970 milhões de pessoas viviam com transtornos mentais, sendo que a ansiedade representava 31% e a depressão, 29%. Já no Judiciário, o problema aparece em quarto lugar para afastamento de magistrados; e em quinto para servidores, de acordo com os dados apresentados pelo psicólogo do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Fábio Angelim.
Angelim ressaltou que a carga de adoecimento impacta na qualidade e no tempo de vida. “Lidar com essas doenças é necessário, inclusive pelo impacto disso nas empresas”, explicou. Segundo levantamento do STJ, o total de licenças no Judiciário provocadas por transtornos mentais pode variar entre 10 e 18% do total de dias de licenças médicas. Já a chance de ser aposentado por transtorno mental é 9,4 vezes maior do que por uma doença osteomuscular; e 2,35 vezes maior do que por neoplasia.
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O psicólogo destacou que é preciso definir critérios com base em dados epidemiológicos para campanhas de prevenção de doenças e atendimentos. “É preciso conhecer a prevalência dessas enfermidades para adaptar as ações de acordo com as necessidades da população de cada tribunal”. De acordo com ele, também é importante preparar os gestores para entender que a licença por doenças mentais é algo sério.
Já a docente do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HCFMUSP) Fátima Macedo enfatizou que “a gestão humanizada faz muita diferença”. Ela apontou que muitos problemas de saúde mental são resultado de um estresse mal administrado. “Precisamos de investimento financeiro, mas também de treinamento e acolhimento com tempo qualificado, atenção e dedicação.”
Fátima Macedo ressaltou que um programa estruturado, que intervém na incidência da doença mental – e não apenas na prevalência –, mostra resultados diferentes. “Atuar em saúde mental no ambiente de trabalho vai muito além de promover bem-estar e de tratar o adoecimento. Mas é observar os motivos para o adoecimento”.
Para o desembargador Sebastião Geraldo de Oliveira, atuar preventivamente, de forma estruturada e organizada, contribui para que se tenha magistrados equilibrados e saudáveis, “o que também beneficia a população, que assim também o quer”.
Texto: Lenir Camimura
Edição: Thaís Cieglinski
Agência CNJ de Notícias