13/09/2023 – 19:55
Vinicius Loures / Câmara dos Deputados
Reginete Bispo: “Esses dados são um marco histórico, demonstram a amplitude das comunidades no País”
Em audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (13), representantes da comunidade negra defenderam que o primeiro censo das comunidades quilombolas é apenas o primeiro passo na garantia de direitos e que o mais importante, a partir de agora, é utilizar os dados para garantir políticas públicas efetivas para a população negra e quilombola.
Conforme explicou a deputada Reginete Bispo (PT-RS), que solicitou o debate, o resultado do censo, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no ano passado, mostrou que o Brasil conta com 1,32 milhão de quilombolas, em 1.696 municípios. Para a parlamentar, o censo precisa ser comemorado, mas também deixa claros os desafios enfrentados por essas comunidades.
“Esses dados são um marco histórico, porque demonstram a diversidade e a amplitude das comunidades quilombolas no nosso País; no entanto, eles também ressaltam desafios críticos, como o acesso à terra, o enfrentamento à violência (como nós bem acompanhamos há décadas) e, no último período, o assassinato da Bernardete no estado da Bahia”, afirmou.
Terra
A terra realmente representa um problema para os povos quilombolas. De acordo com a representante do Ministério da Igualdade Racial no debate, Francinete Pereira da Cruz, existem hoje 494 quilombos delimitados oficialmente. Destes, apenas 147 são titulados pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) ou pelos órgãos estaduais, o que representa somente um pouco mais 29 %.
A deputada Reginete Bispo ressaltou que a situação pode ser ainda mais grave, uma vez que o IBGE recenseou apenas as comunidades certificadas, uma das etapas no processo de reconhecimento territorial. Mas, conforme explicou, “a grande maioria das comunidades” não chegou sequer a essa fase. Para resolver esse problema, a deputada defende que o governo vá até as comunidades fazer esse reconhecimento para que se tenha um retrato melhor da população quilombola.
Vinicius Loures / Câmara dos Deputados
Presidente do Incra: órgão tem 1.800 processos abertos de regularização de territórios quilombolas
Segundo o presidente do Incra, José Henrique Sampaio Pereira, o órgão tem 1.800 processos de regularização de territórios quilombolas abertos. No entanto, não conta com estrutura para atender a essa demanda. Entre 2014 e 2022, o Incra perdeu 40% do seu quadro de funcionários, afirmou. Além disso, o orçamento do órgão para esse ano é de R$ 400 mil para todas as suas atividades, relatou o presidente.
Para o deputado Luiz Couto (PT-PB), é papel do Parlamento cobrar do governo a reestruturação dos órgãos públicos para que se garantam os direitos dos quilombolas.
“O importante primeiro é dar a condição para que, de fato, esse levantamento de todos os quilombos possa ser regulamentado, e, para isso, precisa ter técnicos, gente. Por isso, acho que a luta nossa aqui é de exigir também que o próprio governo possa fazer um concurso com técnicos que, efetivamente, sejam comprometidos com essa causa”, ressaltou.
Racismo
Pelas contas do representante da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos, Denildo de Moraes Biko Rodrigues, nesse ritmo de demarcação, o Estado brasileiro vai levar mais de 2 mil anos para regularizar os mais de 6 mil territórios quilombolas existentes no País. Na opinião do ativista, essa situação é resultado do “racismo fundiário”.
“A gente só vai combater esse racismo fundiário na medida em que for reconhecendo os territórios quilombolas, os territórios de povos indígenas, os territórios de povos e comunidades tradicionais, reconhecendo, demarcando e entregando aqueles territórios para aqueles que são, de fato, os donos da terra.”
Embora considere a questão fundiária fundamental, Biko defende outras políticas para os moradores de quilombo, como formação escolar específica para essa população. Ainda considera importante criar linhas de financiamento com regras especiais. “Como a posse dos quilombos é coletiva, as instituições financeiras negam os pedidos de empréstimo a essas comunidades”, explicou.
Reportagem – Maria Neves
Edição – Ana Chalub