- Página atualizada em 23/05/2023
A Justiça do Trabalho do Ceará teve atuação decisiva no resgate de idosa em situação de trabalho análogo à de escravo há mais de 40 anos. A mulher de 78 anos era explorada como empregada doméstica em troca de comida e moradia em residência da capital cearense. A pedido do Ministério Público do Trabalho (MPT), a 8ª Varas do Trabalho de Fortaleza autorizou os órgãos de fiscalização e a Polícia Federal a realizarem operação que culminou na libertação da vítima. O resgate aconteceu no dia 15 de maio, e as informações foram divulgadas na sexta-feira (19/5).
De acordo com declaração da vítima à Polícia Federal, durante todo o período em que morava com a família – mais de 40 anos – não recebeu salário pelos serviços prestados. Recebia apenas comida, roupas e calçados. Sua tarefa diária consistia em cuidar da casa: fazer limpeza, cozinhar e cuidar das crianças. Informou também que recebe aposentadoria do INSS. O valor, no entanto, era sacado pelo patrão, que lhe dava uma parte e depositava o restante em uma conta movimentada por ele mesmo.
A denúncia foi feita por meio do Disque 100 (canal de denúncia do Ministério dos Direitos Humanos) e encaminhada ao MPT. Após instaurar procedimento para apurar o caso, os procuradores pediram autorização judicial para que as instituições integrantes do Grupo Móvel de Erradicação do Trabalho Escravo – Ministério Público do Trabalho, Superintendência do Trabalho e Polícia Federal – entrassem na residência. A ordem judicial é necessária por proteção à inviolabilidade do domicílio, conforme a Constituição Federal.
Para o juiz do trabalho Célio Timbó, que autorizou a operação, a redução de pessoas à condição análoga à de escravo é uma conduta gravíssima, pois fere a dignidade do trabalhador, limitando sua liberdade e seu acesso aos bens da vida. “Está relacionada à submissão do trabalhador à condições degradantes e precárias, caracterizando uma forma contemporânea de escravidão. Fere direitos humanos basilares e deve ser extirpada da sociedade. Por isso, as autoridades e toda a sociedade devem estar atentos a esse tipo de conduta.”
A Justiça do Trabalho ainda deve julgar as possíveis ações que serão movidas pela vítima. Segundo o magistrado, além de todas as verbas relacionadas ao contrato de trabalho a que têm direito, como salários, férias, décimo terceiro, aviso-prévio e depósitos do FGTS, a mulher ainda pode requerer indenizações por danos morais e existenciais. “O MPT também pode, em ação própria, reivindicar eventual indenização por dano moral coletivo, pois essa situação aviltante atinge a sociedade como um todo”, completou o magistrado.
Durante a abordagem, os patrões da idosa alegaram que ela não era funcionária da casa, mas um membro da família. Ela foi retirada da residência e encaminhada para abrigo de assistência social. Os donos da casa foram autuados por cada uma das irregularidades trabalhistas apuradas pelo órgão de fiscalização. Além das multas e de ação na Justiça do Trabalho, as pessoas envolvidas no caso também devem responder pelo crime de redução à condição análoga à de escravo (Art. 149 do Código Penal). O processo segue em segredo de justiça.