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Muito mais que laços sanguíneos, o ato de adotar criança ou adolescente está ligado aos laços do coração. No caminho da adoção, muitas vidas se encontram, sonhos se realizam e histórias se transformam. Tudo em nome de um amor que é capaz de esperar e vencer qualquer barreira.
Esse caminho passa pelo Poder Judiciário, que atua no processo para garantir toda segurança jurídica e o direito à família, tanto para quem deseja ter quanto para quem espera por uma.
No Dia Nacional da Adoção, celebrado nesta quinta-feira (25/5), o Tribunal de Justiça do Tocantins (TJTO) traz histórias de quem buscou as vias legais e, com o apoio do Judiciário, conseguiu encontrar o filho ou a filha e concretizar o tão esperado processo de adoção.
“Meu filho é meu e ninguém tira ele de mim”
O sonho de ter um filho vinha desde os 18 anos, mas por razões pessoais o comerciante baiano Eziquiel Ribeiro dos Santos Neto teve que adiá-lo até o ano passado, quando conseguiu, por meio do Judiciário do Tocantins, adotar João, hoje com 17 anos. “É muito bom saber que todo esforço, traumas, problemas e investimentos foram gratificantes para mim, pois hoje sei que meu filho é meu e ninguém tira ele de mim”, diz o comerciante ao se lembrar de situações que teve que enfrentar, como o preconceito por sua orientação sexual, para conseguir na justiça o direito de ter um filho.
“A decisão judicial me dando o meu filho, que hoje já tem o meu sobrenome, foi a melhor coisa do mundo. Faria tudo de novo, se preciso fosse”, conta, ao compartilhar um pouco da sua experiência. Segundo Santos Neto, o processo de adoção do filho foi iniciado em 2019, após o falecimento de seu companheiro, que, conforme citou, não aceitava a ideia, principalmente sua opção pela adoção tardia.
Conta ainda que passou por todas as etapas necessárias. Depois de habilitado, ele diz que entrou em cinco grupos de adoção, de vários estados, participou de lives, de curso, palestras e reuniões de grupos por vídeo conferência, em função da pandemia da Covid 19.
Nesse período, também conheceu o aplicativo A. Dot, ferramenta desenvolvida pelo Tribunal de Justiça do Paraná, com o qual o Tribunal do Tocantins possui parceria, que conecta crianças e adolescentes em condições de adoção com pretendentes habilitados no Cadastro Nacional de Adoção e Acolhimento.
Por meio do aplicativo, ele comenta que teve acesso a fotos e vídeos de crianças e adolescentes disponíveis para adoção e foi lá que encontrou seu filho. “Eu me manifestei, entrei em contato com ele e depois direto com o Fórum (de Palmas) e dei início ao processo de aproximação por videochamada e depois presencialmente”, narra.
Segundo Eziquiel Santos Neto, no Judiciário do Tocantins encontrou a atenção e o apoio que precisava para continuar o processo. “Foram muito atenciosos comigo”, diz, se referindo tanto às equipes do Juizado da Infância e Juventude de Palmas e de Salinas da Margarida (BA), cidade onde mora, como da Promotoria da Infância e Juventude de Palmas.
Emoção do primeiro encontro
O primeiro encontro, conforme expõe o comerciante, foi muito emocionante, tanto para ele quanto para João. “Ele chorou muito, a gente conversou bastante. Nós nos entendemos logo de primeira. Acredito que foi aquela coisa espiritual, nos identificamos muito”, comenta. Santos Neto informa que chegou a receber indicação de outras crianças e adolescentes de acordo com o perfil descrito por ele no cadastro, mas que não se interessou, porque já tinha encontrado o filho que tanto sonhava ter. “Meu foco era ele, era ele quem eu tinha que tirar de lá de Palmas”, destaca.
“Foi a melhor coisa. Meu filho é um menino muito estudioso, inteligente, muito bom, e eu só tenho orgulho de ter lutado por ele.” O comerciante revela que tinha a intenção de adotar mais um filho, mas diz que João não quer ter irmãos.
Para o futuro, Santos Neto informa que, após o filho concluir o ensino médio, os planos é ir morar em Portugal, onde o adolescente pretende cursar Medicina. “O João é o maior presente que a vida me deu, que Deus me deu”.
“Tínhamos a certeza de que ela era nossa filha”
O lar do casal Walter Cardoso de Brito e Ana Beatriz Dias nunca mais foi o mesmo desde a chegada da pequena Maria (nome fictício), no inicio de 2021. Eles já eram pais de uma menina de 4 anos quando decidiram buscar o apoio da Justiça para aumentar a família, decisão que mudou a vida de todos: “completou a família”, destaca Brito.
O desejo de adotar um filho veio bem antes de Ana Beatriz engravidar e dar à luz à primeira filha do casal. Segundo ela, que é médica, quando a filha fez dois anos, o casal decidiu retomar o processo de adoção. “Como já tínhamos uma filha pequena, colocamos como critério uma criança com idade mais próxima da dela”, disse Brito, que é servidor público.
Da habilitação até a adoção de Maria, passaram-se cerca de dois anos. “Ligaram do Fórum (Juizado da Infância e Juventude de Palmas) e falaram que éramos do perfil de uma criança que estava no abrigo disponível para adoção e perguntaram se a gente tinha interesse”, conta Ana, lembrando-se que desde aquele instante sentiu que tinha ganhado mais uma filha. “Já tínhamos a certeza que ela era nossa.”
Explosão de amor
O encontro com a pequena Maria, na época com apenas dois meses de vida, aconteceu em plena pandemia e, para Ana, foi um misto de emoções. “Quando a gente gesta, o amor vai crescendo gradualmente, a cada dia a gente vai amando mais. Mas quando chega pronto (o filho), é aquela explosão de amor de uma só vez”, declara a médica.
“É um amor muito grato, a gente olhar para esse ser humano que Deus nos confiou e saber que ela nos aceitou”, ressalta Ana, citando o sentimento recíproco entre o casal e a pequena Maria.
Processo tranquilo
O processo de adoção foi muito tranquilo e rápido, de acordo com o casal. “Ela veio em fevereiro de 2021 e, em junho, e já estávamos com a certidão de nascimento dela com o nosso sobrenome”, revela Ana Beatriz.
Hoje, o casal se divide entre as tarefas profissionais e as atividades em prol do desenvolvimento das filhas, a mais velha prestes a completar 7 anos. “Elas são muito parceiras”, diz Brito. Até o comportamento da filha mais velha mudou para melhor, depois da chegada da irmã, segundo Ana. “Ficou mais leve, mais doce, sem exigir tanto a presença da gente o tempo inteiro”, enfatiza.
“É maravilhoso ver todo o desenvolvimento dos filhos”, pontua Brito. “Buscamos o desenvolvimento pleno para as duas e pretendemos acompanhar esse desenvolvimento o mais próximo possível. Queremos reforçar os princípios dentro de casa para que lá fora elas tenham discernimento para escolher o que é melhor”, frisa Ana.
“Nós agradecemos profundamente a mãe biológica da Maria pela oportunidade que deu a ela de ser esse ser humano. Toda criança, desde a concepção, deveria ter essa oportunidade”, comenta Brito. “A gente sabe que não é uma situação fácil para nenhuma mãe, mas ela pensou mais na Maria do que nela mesma e deu a ela essa oportunidade”, revela, relatando que hoje Maria estuda e tem uma família que proporciona a ela não só uma condição financeira, mas também um lar estável. “Se depender da gente, ela será um ser humano exemplar”, sinaliza, destacando que o papel dele e da esposa é dar condições de vida à pequena Maria e sua irmã, e acompanhar o desenvolvimento das duas.
“Certeza da legalidade no processo de adoção”
O papel do Judiciário no processo de adoção é garantir a certeza da legalidade, conforme cita o juiz Adriano Gomes de Melo Oliveira. O magistrado menciona que cabe à Justiça garantir que crianças não sejam retiradas da mãe sem que ela tenha o direito de ser ouvida e de receber assistência.
Por isso, segundo o juiz, é muito importante que todas as mulheres tenham consciência de que é dada a elas a oportunidade de colocar os filhos para adoção, se por algum motivo não quiserem exercer a maternidade. “É um direito dela, previsto em lei”, assegura o magistrado, ressaltando que o procedimento é procurar o Judiciário e manifestar o desejo, pois quando esse processo é feito de forma irregular, prejudica-se pessoas que estão na fila, agindo no caminho correto e coloca-se em risco a segurança da criança.
Nesses casos de entrega voluntária, segundo o titular do Juizado da Infância e Juventude, é prestada à mulher toda assistência. “É verificado se realmente a mulher está com a vontade livre, se não está precisando de uma ajuda psicológica, se não é meramente uma questão financeira que pode ser resolvida”, diz. “Caso contrário, ela vai poder, legalmente, estabelecer que o filho fique com alguém que já teve a situação verificada na Justiça”, ressalta o juiz, acrescentando que esse procedimento não causa trauma para a mãe e a probabilidade dela se arrepender é muito menor.
Foco em situações humanas
“Não tratamos apenas, especificamente, de pegar um livro, olhar uma lei e aplicar aquilo como uma situação automática que um computador, uma inteligência artificial poderia fazer. Nós temos realmente que focar em situações humanas e cotidianas”, enfatiza o juiz Adriano Oliveira ao falar da atuação do Judiciário no processo de adoção. “Nós temos que trabalhar não apenas com o ‘julgo, declaro’, mas atuar com esse lado humano”, completa, ressaltando o trabalho conjunto com os promotores de justiça, advogados, defensores públicos, assistentes sociais, psicólogos e agentes públicos.
Para o magistrado, as recompensas do trabalho vêm quando se consegue reintegrar crianças e adolescentes às famílias de origem, quando se percebe os laços sendo criados entre crianças e pessoas que vão adotá-las, e quando se concretiza um processo de adoção.
Fonte: TJTO