28/05/2025 – 15:25
Zeca Ribeiro / Câmara dos Deputados
O parecer de Fausto Pinato deve ser votado em junho
O relator do projeto de lei (PL 469/24) que proíbe a tarifação pelo uso intensivo da rede por provedores de conteúdo, deputado Fausto Pinato (PP-SP), disse que seu parecer levará em conta a opinião dos especialistas ouvidos nesta quarta-feira (28) na Comissão de Ciência, Tecnologia e Inovação da Câmara dos Deputados.
Ele adiantou, porém, que não vai deixar para a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) decidir se provedores de conexão de internet (operadoras de telecomunicações) poderão ou não cobrar tarifa dos provedores de conteúdo, como plataformas de streaming e redes sociais, para custear a infraestrutura das redes.
“É injusto para um lado a cobrança. Mas também, se não tiver alguma coisa, pode deteriorar [o sistema], mas desde que seja algo justo e equilibrado. Não vou deixar, no meu relatório, a Anatel dar as cartas”, avisou Pinato.
Uma parte dos especialistas ouvidos nesta quarta condenou a criação de uma taxa de tráfego com o argumento de que o consumidor acabará pagando a conta. Alguns convidados, no entanto, ponderaram que seria melhor buscar um meio termo que garanta a sustentabilidade do sistema que envolve operadoras de telecomunicações, grandes empresas de conteúdo e consumidores.
Dupla cobrançaO presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Flávio Lara Resende, foi um dos que se manifestaram contrariamente à taxa de uso de rede, que a seu ver não é a solução para atacar o problema da conectividade no Brasil. “Qualquer taxa aplicada seria depois transferida para o consumidor e levaria à desaceleração do investimento.”
Também na avaliação do diretor-executivo da Aliança pela Internet Aberta (AIA), Alessandro Molon, a taxa representaria uma dupla cobrança e beneficiaria operadoras de telecomunicações que já ganham com o modelo atual.
Ele disse ainda que já não há expectativa de explosão do crescimento do tráfego, como havia há alguns anos. Segundo o diretor, o que vem caindo na fatura das operadoras de telecomunicações são setores que não têm nada a ver com internet, como a telefonia fixa e a TV a cabo.
“Se a taxa for criada, quem vai perder acesso é o consumidor de baixa renda. O streaming, se ele tiver que pagar para ser assistido também para uma operadora, isso vai entrar na fatura dele”, afirmou Molon. “Eu vou pagar a minha conexão fixa para ter banda larga e vou ter que pagar de novo pelo mesmo serviço: na minha mensalidade do streaming, vai ter um pedacinho que vai para as operadoras”, explicou.
Os pequenos provedores de conexão, responsáveis por 95% das conexões nas cidades com até 30 mil habitantes e 64% das conexões de banda larga fixas no Brasil, também se posicionaram contra a cobrança de taxa, que prejudicaria as regiões mais afastadas.
“As pessoas contratam internet para acessar conteúdos diversos e esses conteúdos estimulam a contratação de serviços mais robustos”, argumentou o diretor administrativo da Associação Brasileira de Provedores de Internet e Telecomunicações (Abrint), Mauricélio Oliveira. “O usuário paga a empresa de telecomunicações e as empresas de conteúdo também pagam para se conectar à internet e disponibilizar seus conteúdos.”
Os convidados contrários à taxa mencionaram ainda o exemplo da Coreia do Sul, onde a tarifação levou ao aumento dos preços da conexão, à piora na qualidade da internet e ao fechamento de postos de trabalho.
NegociaçãoDo outro lado, o diretor de Regulação e Inovação da Conexis Brasil Digital, Fernando Soares, argumentou justamente o contrário. Ele disse que o tráfego de dados tem base imensa e continua crescendo, o que requer investimentos que garantam qualidade e conectividade.
Ele destacou que apenas quatro empresas – Meta, Alphabet, Netflix e TikTok – são responsáveis por 72% do tráfego de dados na rede móvel e 52% na banda larga fixa.
Para Soares, é dever de todos os agentes do ecossistema digital investir em infraestrutura, e o projeto de lei limita ou mesmo impede a negociação entre operadoras de telecomunicações e bigtechs. Ele também sugeriu que o Congresso Nacional determine à Anatel mediar a relação entre as partes do sistema.
“O que a gente quer é que a Câmara estabeleça claramente os contornos de uma negociação e que essa negociação permita o financiamento dos investimentos necessários para o provimento de infraestrutura”, disse Fernando Soares.
AlternativasTambém convidado, o ex-deputado federal Paulo Henrique Lustosa chamou a atenção para a necessidade de pensar a sustentabilidade de um ecossistema que tem grandes operadoras de telecom, mas também médios e pequenos provedores que fazem chegar o serviço a quem usa o conteúdo.
A solução, segundo Lustosa, não é proibir simplesmente a criação de uma tarifa ou impor sua cobrança. “A gente pode aproveitar a oportunidade para construir um modelo para que o serviço chegue para todos com qualidade, preço módico e de forma universal.”
Para o deputado Vitor Lippi (PSDB-SP), proibir que haja um entendimento entre o uso dessas redes também não seria o mais prudente. “Gostaria que se buscasse uma alternativa que não engesse o tema. A infraestrutura precisa de recursos, mas precisamos fazer o possível para não onerar o consumidor, principalmente o mais humilde”, defendeu.
Ambiente saudávelAutor do Projeto de Lei 469/24, o deputado David Soares (União-SP), explicou que apresentou a proposta por temer o repasse de uma possível tarifa para o consumidor, com prejuízos para os pequenos provedores de internet. “Não queremos quebrar ninguém, queremos colocar um ambiente de negócios saudável”, destacou.
A expectativa do presidente da Comissão de Ciência, Tecnologia e Inovação, deputado Ricardo Barros (PP-PR), é votar o relatório de Fausto Pinato ainda em junho.
Reportagem – Noéli NobreEdição – Natalia Doederlein