Regina Boaes de Carvalho foi uma das primeiras servidoras concursadas do TJAM. Lotada na CGJ/AM desde 1981, participou da informatização do órgão e foi secretária do primeiro PAD realizado no estado.
Regina Boaes de Carvalho tinha 22 anos, era caixa-geral de uma rede de lojas, estava grávida e tinha o sonho de tornar-se funcionária da Prefeitura de Manaus quando, caminhando pela avenida Eduardo Ribeiro, no Centro de Manaus, parou para contemplar a beleza arquitetônica do então Palácio da Justiça Clóvis Bevilácqua, atualmente Centro Memorial e Cultural do Judiciário do Estado do Amazonas, antiga sede do Tribunal de Justiça.
Na época, não sabia muito bem o que funcionava naquele local, mas isso não importava muito para quem só estava querendo desacelerar os pensamentos diante de um símbolo cuja graciosidade desafiava o tempo. Absorta, foi despertada pelo segurança do local que perguntou: “A senhora veio fazer a inscrição para o concurso?”. Àquela frase a despertou também para uma nova realidade – que 42 anos depois, ainda torna melhor cada um de seus dias.
Tomou aquele momento como uma oportunidade e assumiu o desafio de concorrer ao certame que estava em curso. Estudou “escondida”, nas poucas horas vagas que tinha entre as atividades profissionais e de dona de casa e mãe – esperava seu primeiro filho. “Tinha receio de incomodar o chefe e criar falsas expectativas na família”, revela. Mas o esforço deu certo! Passou em 5.º lugar, para surpresa de todos, inclusive dela mesma que não acreditava no resultado.
“Tive medo, não achava que fosse capaz. No dia do resultado acordei insegura, voltei ao prédio do Tribunal, sentei de frente para parede onde estava afixada a lista de aprovados e esperei pacientemente o movimento de pessoas diminuir para, incrédula, buscar pelo meu nome. De lá observava a alegria ou a frustração tomar conta dos rostos de quem ali chegara, ávidos para conhecer o resultado. Não queria que as pessoas também me julgassem, por isso esperei saírem. Quando criei coragem e me aproximei, fui tomada por um largo sorriso e por uma grande medida de autoconfiança. Havia conseguido!”, relembra Regina.
Dias depois, naquele mesmo ano de 1981, ela foi lotada na Corregedoria-Geral de Justiça (CGJ-AM), onde permanece até hoje – agora, no setor de Protocolo de Autuação Virtual. “Quando assumi na CGJ, aqui era muito diferente, todos os servidores cabiam em uma sala. Hoje são vários setores. É fantástico ver como a Corregedoria cresceu em tamanho e importância”, observa Regina – que atualmente é a servidora mais antiga em atividade no órgão correicional (seu cargo efetivo de ‘Assessora Especial’ está no rol dos cargos em extinção, no TJAM).
Pioneirismo
Regina acompanhou o processo de informatização do Judiciário, foi uma das primeiras servidoras a usar um computador na Corte e também recebeu a incumbência de ensinar os colegas a utilizarem os recursos do equipamento. Segundo a servidora, quando chegou ao TJAM teve que provar capacidade para ter o direito de usar uma máquina de “datilografia manual” (antecessora da máquina elétrica). A proporção que mostrou comprometimento e argúcia foi agraciada com uma ‘elétrica’, “e que passou a ser cobiçada por muitos”, brinca.
Ela relembra o dia em que chegou ao trabalho e encontrou a mesa vazia. Assustada, foi procurar a “moderna IBM” que lhe acompanhava no dia a dia do cargo, quando recebeu a boa notícia de que a Corregedoria seria a primeira unidade informatizada dentro do TJAM, por isso a máquina havia sido recolhida e ela recebeu um computador para trabalhar.
De acordo com Regina, “o responsável pela revolução tecnológica havia sido o então juiz-corregedor auxiliar e atual desembargador, Cezar Bandiera, que em uma viagem ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) se deparou com a novidade e entendeu a importância de nos adaptarmos ao inexorável caminho da informatização”.
Outro pioneirismo que a servidora coleciona é de ter secretariado o então juiz-corregedor auxiliar Carlos Henrique Rodrigues, já falecido, no primeiro Processo Administrativo Disciplinar (PAD) realizado pela Corregedoria do Amazonas. “Tratava-se de um cartorário do interior que fazia certidões de Registro Civil sem a devida anotação no livro oficial do cartório. A medida que as pessoas precisavam de 2.ª via não tinha como emitir. E o caso chegou a conhecimento do órgão”, ressalta. Para suprir os impulsos dos mais “curiosos”, ela conta o desfecho: “o réu foi exonerado”.
Afetividade
Comunicativa e cheia de atitude, a servidora Regina Boaes de Carvalho conquistou a simpatia e, com o passar do tempo, a amizade, o respeito e o reconhecimento profissional de muitas pessoas do ambiente profissional. Ao longo dos 42 anos de atividade na CGJ-AM, ela colaborou de diversas formas em vários setores do Judiciário sem nunca mudar de lotação porque, na prática, dedicava-se integralmente às demandas que lhes eram apresentadas.
Ao contar sua história, a lista de nomes mencionados por Regina durante a entrevista é grande. Listamos, no entanto, alguns que, de forma muito particular, fazem parte da biografia da servidora: dona Cândida Fernandes (mãe do atual corregedor-geral de Justiça, desembargador Jomar Saunders Fernandes), então diretora da Secretaria-Geral do TJAM; também Salete Praia; Leonor; Aldamira; as irmãs Eneida e Elisa; a desembargadora aposentada Liana Belém, já falecida; Ivanilde Pereira (à época diretora do setor de Distribuição de 1.º Grau); as irmãs Salignac: Ney, Lenise e Nilze; além da amiga de concurso, Soraia Maquiné.
Cura
Considerando tudo que acumulou de experiência, sabedoria e conhecimento dentro do TJAM, Regina revela que se pudesse deixar um conselho aos colegas, seria esse: “Trabalhe com amor e coloque-se no lugar do outro. Construa pontes, não muros”.
De acordo com ela, a eficácia dessa ação foi testada e aprovada em sua vida profissional, refletindo de forma muito positiva também na vida pessoal.
Há três anos a servidora viveu um momento bastante crítico quando precisou realizar tratamento oncológico em meio a pandemia de covid-19. Emocionada, ela revela que recebeu dos amigos que colecionou ao longo de sua jornada no Judiciário do Amazonas um amor sem medida – que considera ter sido um dos “remédios” mais preciosos no seu processo de cura. “Adoeci no auge da pandemia. Lembro com muito carinho e gratidão as inúmeras vezes que meus amigos iam de carro até a frente da minha casa e de lá me ligavam dizendo “estou aqui”. Ali, parados, passavam horas conversando comigo ao telefone e me pediam para dar um ‘tchauzinho’ da varanda para terem certeza que estava superando bem os desafios”.
Se pudesse definir a CGJ-AM em uma frase, seria: “é parte da minha família”, garante. Talvez por isso ela não pense em deixar de conviver nesse ambiente tão cedo. “A aposentadoria voluntária não faz parte dos meus planos”, revela. Sorte a nossa que dividimos com ela esse momento da história da Corregedoria-Geral de Justiça do Amazonas – e ainda muitos outros que virão, porque àquela menina grávida, que parou apenas para contemplar a bela arquitetura do ‘Palácio da Justiça’, segue 42 anos depois transformando seus medos em conquistas, pessoas em amigos e muros em pontes.
Alguns registros históricos da época:
Regina relembra que em 1981, quando assumiu o cargo no TJAM, o desembargador Paulino Gomes era presidente do Judiciário do Amazonas e o desembargador Jerônimo Raposo da Câmara, o corregedor-geral de Justiça. O plenário do Tribunal de Justiça do Estado era composto por 14 desembargadores.
À época, Gilberto Mestrinho era governador do Amazonas – e Manoel Ribeiro, o vice. Diferente do que acontece hoje, não havia segundo turno em eleições majoritárias.
O salário dos servidores de carreira tinha valor muito próximo ao piso mínimo nacional e o Distrito Industrial de Manaus estava em franca expansão, pagando remunerações melhores que o serviço público do Estado à época – nos vários níveis de formação.
*O texto é parte do projeto “Memórias da CGJ-AM”, que reúne relatos de servidores que trabalham e que já atuaram no órgão. Tem o intuito de reavivar sentimentos, lembranças, fatos marcantes da própria vida que se misturam à história do Judiciário do Amazonas, em especial da Corregedoria-Geral de Justiça. Mais informações: 2129-6672 – Setor de Comunicação Social da CGJ-AM.
#PraTodosVerem: Imagem principal da matéria traz a servidora Regina Boaes de Carvalho, uma das primeiras servidoras concursadas do TJAM e lotada na CGJ/AM desde 1981. Sorridente, ela está vestida com uma roupa de mangas compridas na cor creme, e aparece sentada com as mãos apoiada em uma mesa de madeira, que tem dois microcomputadores e um calendário. Ao lado da mesa há um mural com a fotografia, em preto e branco, do Palácio da Justiça Clóvis Bevilácqua, atualmente Centro Memorial e Cultural do Judiciário do Estado do Amazonas, antiga sede do Tribunal de Justiça.
Dora Paula/CGJ/AM
Fotos: Acervo pessoal Regina Boaes de Carvalho; Dora Paula/CGJ-AM
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