05/10/2023 – 12:14
Vinicius Loures/Câmara dos Deputados
Lea Patricia: “Quero justiça, não só pela minha filha, mas por todas as mães”
Dados do Relatório das Nações Unidas mostram que uma em cada quatro mulheres já sofreu violência obstétrica no Brasil. Para dar voz a algumas dessas vítimas, a Comissão Especial sobre Violência Obstétrica e Morte Materna realizou, na Câmara dos Deputados, audiência pública nesta quarta-feira (4).
Layane Martins, vítima de violência obstétrica em um hospital particular em agosto deste ano, contou que sua filha, Helena, chegou a ficar em sofrimento fetal por quase uma hora durante o parto. A menina não resistiu. Layane disse que sofre todos os dias pela perda da filha. “O sistema precisa mudar para que a gente evite essas mortes. Algo tem que ser feito, e eu vou lutar pela Helena até o fim, mesmo que as minhas chances de reparação sejam mínimas”, desabafou.
A deputada Silvye Alves (União-GO), que propôs o debate, disse que o parto é visto como o momento mais lindo na vida de grande parte das mulheres, mas acaba se tornando um pesadelo para quem passa por violência e negligência nesse período. “O que se espera desta comissão é uma ação conjunta para que possamos mudar essa realidade.”
A deputada Talíria Petrone (Psol-RJ) também deseja que o Parlamento ajude a elaborar um marco legal que acabe com a violência obstétrica no País. “Que o atendimento seja mais humanizado para todas as mulheres que optem por gestar e por parir”, declarou.
Números
O levantamento Nascer no Brasil, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), aponta que 30% das mulheres atendidas em hospitais privados em 2012 sofreram violência obstétrica. No Sistema Único de Saúde (SUS), a taxa foi de 45%.
Vinicius Loures/Câmara dos Deputados
Deputada Silvye Alves propôs a realização da audiência pública
Lea Patrícia, vítima desse tipo de violência na rede pública relatou a dor de perder duas filhas em menos de 30 dias, em 2020. Ela contou que foi negligenciada pelos médicos, e sua filha Ana Clara nasceu antes de chegar ao hospital. Não havia UTI nem qualquer ambiente especializado para receber recém-nascidos no ambulatório. A menina faleceu sem receber os cuidados necessários.
22 dias depois, ainda no puerpério, Lea retornou ao hospital com a outra filha, de 17 anos, que também estava grávida. Segundo Lea, a adolescente teve o útero deslocado pelo médico e sofreu hemorragia interna. Teve o seu bebê pela manhã e faleceu à noite, pois não recebeu as bolsas de sangue de que precisava.
Lea Patrícia comentou que, desde então, está com depressão e ansiedade e não consegue mais trabalhar. Ela não teve nenhum amparo do hospital. “Eles destruíram a minha família. Quero justiça, não só pela minha filha, mas por todas as mães que passaram por violência obstétrica”, declarou.
Direito a acompanhante é lei
Por sua vez, Ellen Ribeiro relatou que foi vítima de violência desde o pré-natal. Ela disse que, nesse período, foi atendida por pessoas que cometiam negligência, racismo obstétrico e exercício da medicina sem embasamento científico. Ellen não teve direito, por exemplo, a coletar materiais biológicos para acompanhar a própria saúde e da sua filha, pois a enfermeira se recusava a realizar o exame.
Com 34 semanas de gestação, em outubro de 2021, ela perdeu a filha. Na maternidade, enquanto sofria com dores, foi negada a ter uma acompanhante ao seu lado. “A negação de ter acompanhante também é uma forma de violência contra a mulher”, ressaltou.
Desde 2005, a Lei 11.108/05 garante à gestante o direito a acompanhante no SUS durante o trabalho de parto, no parto e no pós-parto.
Reportagem – Joana Lacerda
Edição – Marcelo Oliveira