Da Agência STJ (Superior Tribunal de Justiça)
BRASÍLIA – O STJ aceitou recurso de um advogado criminal e professor universitário que requereu a inclusão em seu registro civil do sobrenome de sua avó materna, com o objetivo de evitar constrangimentos, em virtude da existência de outro indivíduo de mesmo nome como réu em ações penais.
“A possibilidade de um potencial cliente do advogado fazer uma consulta em sites de buscas na internet sobre o profissional e encontrar o seu nome vinculado a processo criminal pode causar um embaraço que atinge diretamente sua imagem e sua reputação, configurando motivo bastante para justificar a correção do registro”, afirmou o relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze.
Segundo os autos, o advogado, ao entrar com ação judicial de correção de registros públicos, também alegou a intenção de homenagear sua avó materna, com quem sempre manteve fortes laços afetivos.
Em primeira instância, por se reconhecer a confusão trazida pelo xará, o pedido foi julgado parcialmente procedente para autorizar o autor a acrescentar o sobrenome paterno, sob o argumento de que o sobrenome pretendido não constava do nome dos ascendentes diretos do advogado.
O TJMG (Tribunal de Justiça de Minas Gerais), após recurso interposto pelo autor da ação, reconheceu que a sentença foi ultra petita, pois o pedido inicial estava limitado ao acréscimo do nome da avó materna, e julgou improcedente o pedido.
O STJ considera a nova realidade social para decidir sobre a correção do registro civil
No STJ, o relator lembrou que o nome é responsável por individualizar seu portador no âmbito das relações civis, de forma que seu registro civil é imprescindível para garantir a proteção estatal sobre ele.
“O direito ao nome está ligado a seu aspecto público dado pelo registro de pessoas naturais, segundo o qual o Estado determina limites para os nomes e seus elementos constitutivos, tal como a obrigatoriedade de conter ao menos um prenome e um sobrenome”.
Destacou ainda que a lei que trata sobre o tema consagra o princípio da imutabilidade do nome, de maneira que o prenome e sobrenome são imutáveis, com a finalidade de garantir a segurança jurídica e a estabilidade das relações jurídicas.
Entretanto, Bellizze ponderou que o STJ vem evoluindo em sua interpretação, de forma a considerar a nova realidade social e acompanhar a velocidade de transformação das relações jurídicas, passando a entender que o tema está inserido no âmbito da autonomia privada, apesar de não perder seu aspecto público, visto que somente será admissível a correção quando não se verificarem riscos a terceiros e à segurança jurídica.
Existência de homonímia não basta para alterar registro, é necessário comprovar o prejuízo
O relator pontuou ainda que, de fato, uma das reais funções do nome de família é diminuir a possibilidade de xarás e evitar prejuízos à identificação da pessoa a ponto de lhe causar algum constrangimento. Porém, ressaltou que a alegação do prejuízo não basta, sendo necessária a comprovação dele.
“A mera existência de pessoa com o mesmo nome não é argumento suficiente para determinar a correção do registro civil, sendo imprescindível a demonstração de que o fato impõe ao sujeito situações vexatórias, humilhantes e constrangedoras, que possam atingir diretamente a sua personalidade e sua dignidade”.
No caso dos autos, o relator recordou que o juiz expôs que a existência de xará estaria gerando constrangimentos ao advogado e que a Corte Estadual, também, consignou a existência de um xará respondendo a processo criminal no Rio Grande do Sul.
“O recorrente é advogado atuante na área criminal e professor universitário de direito processual penal, de modo que a existência de um xará que responde a processo criminal, ainda que em outro estado da federação, pode gerar um constrangimento capaz de configurar o justo motivo para fundamentar a inclusão do nome de família pretendido”.
Sem ofensa à segurança jurídica e à estabilidade das relações jurídicas
Para o ministro, a alteração do nome, nesta situação, não representa qualquer ofensa à segurança jurídica e à estabilidade das relações jurídicas, já que haverá tão somente a inclusão do sobrenome da avó materna do autor, sem exclusão de nenhum outro nome de família.
Quanto à pretendida homenagem à avó, Bellizze afirmou não ser tal argumento idôneo para a mudança no nome.
“O sobrenome não tem a função de estreitar vínculos afetivos com os membros da família, pois sua função primordial é revelar a procedência familiar no meio social e reduzir as possibilidades de outras pessoas com o mesmo nome”.
Leia o acórdão do REsp 1.962.674.