Da Agência STJ (Superior Tribunal de Justiça)
A Primeira Turma do STJ manteve decisão que estabeleceu o prazo de até um ano para que a União e a Funai destinem área para a sobrevivência física e cultural do grupo indígena Fulkaxó, atualmente em conflito com a etnia Kariri-Xocó, com a qual divide o mesmo território no município de Porto Real do Colégio (AL).
Para o colegiado, o Poder Judiciário pode determinar, diante de injustificável inércia estatal, que o Executivo adote medidas necessárias à concretização de direitos constitucionais dos indígenas, razão pela qual não se pode falar, no caso, em violação do princípio da separação dos poderes.
No julgamento, ficou determinado que o prazo seja contado a partir do trânsito em julgado da sentença proferida no processo “tempo suficiente para que a administração pública faça o planejamento financeiro e orçamentário dos gastos com a regularização fundiária”, segundo o relator, ministro Gurgel de Faria.
Divergências culturais entre as tribos e insuficiência de terras estariam na raiz dos conflitos
O recurso teve origem em ação civil pública movida pelo MPF contra a União e a Funai para exigir a conclusão do processo administrativo em que os Fulkaxós solicitaram a adoção de providências urgentes para a sua sobrevivência.
O MPF também pediu que fossem adquiridas terras em benefício desse grupo indígena, ante a impossibilidade de convivência pacífica com os índios da etnia Kariri-Xocó (da qual os primeiros se originam).
As principais causas do conflito seriam a insuficiência de terras e a discriminação sofrida pelos Fulkaxós na distribuição de benefícios na comunidade, além de outras desavenças relacionadas a decisões políticas, costumes e tradições.
O juízo de primeiro grau condenou a União e a Funai a concluir o processo administrativo em quatro meses, a contar da sentença, bem como a adquirir e demarcar as terras para o grupo Fulkaxó, no prazo de um ano após o trânsito em julgado.
A decisão foi mantida pelo TRF5 (Tribunal Regional Federal da 5ª Região).
Criação de reserva indígena para sobrevivência de etnia
O relator no STJ explicou que o caso não trata de terras indígenas tradicionais, aquelas cuja posse os indígenas exercem de forma imemorial, questão submetida à análise do Supremo Tribunal Federal, tampouco se refere ao processo administrativo de demarcação e ampliação das terras Kariri-Xocó, matéria objeto de outra ação, que se encontra suspensa por determinação do TRF5.
A controvérsia, acrescentou o ministro, diz respeito à obrigação de a União e a Funai criarem uma reserva indígena para o povo Fulkaxó.
Gurgel de Faria observou que as reservas indígenas “poderão ser instituídas em propriedade da União, bem como ser adquiridas mediante compra, doação de terceiros ou desapropriação, na eventualidade de não se verificar a tradicionalidade da ocupação indígena ou de se constatar a insuficiência de terra demarcada, sendo possível, ainda, a intervenção do ente federal em terra indígena para a resolução de casos excepcionais, como os de conflito interno irreversível entre grupos tribais”.
Segundo o ministro, a modificação do julgado, como pediram a União e a Funai, para reconhecer que os conflitos entre as duas tribos não as impediriam de ocupar o mesmo território, exigiria o reexame das provas do processo, o que é vedado em recurso especial pela Súmula 7 do STJ.