Combate à escravidão e à exploração sexual foram temas debatidos na Tribuna Jurídica sobre “Tráfico de Pessoas”

O Judiciário
O Judiciário

Evento promovido pela Esmam aconteceu na terça-feira e a íntegra pode ser conferida no canal da escola no YouTube.


A Escola Superior da Magistratura do Amazonas (Esmam) realizou na terça-feira (9/5), mais uma edição do “Projeto Tribuna Jurídica”, que desta vez abordou o tema “Tráfico de Pessoas”. O evento, que aconteceu no formato presencial, no auditório do Centro Administrativo José de Jesus F. Lopes, anexo à Sede do TJAM, visou a atender a Resolução n.º 212/2015 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que institui o Fórum Nacional do Poder Judiciário para monitoramento e efetividade das demandas relacionadas à exploração do trabalho em condições análogas à escravidão e ao tráfico de pessoas, com o objetivo de elaborar estudos e propor medidas para o aperfeiçoamento do sistema judicial quanto ao tema.

Delegada da Polícia Federal, Letícia Prado da Silva Cavalcanti de Holanda, chefe da Delegacia de Repressão a Crimes Cibernéticos do Amazonas, uma das palestrantes do evento, disse que, no Amazonas, registra-se dois movimentos: tanto o de pessoas chegando ao Estado por conta do tráfico de pessoas quanto por conta do que a ONU chama de contrabando de pessoas, que na realidade, tecnicamente, aqui entende-se como a promoção de imigração ilegal.

“São pessoas que vêm da fronteira, principalmente da Venezuela. Hoje, os maiores números são de venezuelanos e indianos. Os indianos não ficam aqui, estão de passagem. Já conseguimos entender que na realidade estão em uma rota e o Brasil está na rota deles com destino aos Estados Unidos. Com isso, eles entram aqui ilegalmente, de forma voluntária, e existem pessoas brasileiras que promovem esse ingresso. Isso é um crime, chamado promoção ilegal de imigrantes”, frisou a delegada Letícia.

Em relação ao tráfico de pessoas, a representante da Polícia Federal mencionou que o criminoso entra em contato com a pessoa de forma fraudulenta ou violenta, enganando essa pessoa, dizendo que vai contratá-la para algum serviço ou com a promessa de que será modelo, quando na realidade ele a está traficando. “A gente vê esse movimento no Amazonas, principalmente de saída, porque é um movimento do Brasil. Geralmente, a pessoa sai para ser traficada. Nesse caso, figuramos estatisticamente como um país mais de saída pelo tráfico de pessoas do que de entrada”, explicou Letícia.

A delegada complementou que o Estado enfrenta um grande problema para o enfrentamento dessas situações, que é a dificuldade de acesso a muitos municípios. “Como esse acesso é complicado e o Estado não consegue ficar o tempo todo fiscalizando, acaba tendo certa facilidade, principalmente, na região da tríplice fronteira, a região de São Gabriel da Cachoeira e de Tabatinga. São pontos de saída, assim como em Roraima, temos Pacaraima”, acrescentou.

Ela também pontuou que o tráfico de drogas, na comparação com o tráfico de pessoas, é mais “rentável”, mas que este segundo na lista. “O tráfico de drogas a gente vê à luz do dia o tempo todo, mas o tráfico de pessoas tem potencial para ultrapassar o tráfico de drogas”, finalizou a delegada.

Doutora em Sociedade e Cultura na Amazônia e pós-doutora em Sociedade e Fronteiras, Márcia Maria de Oliveira ressaltou o papel da Amazônia no tráfico de pessoas. “Estamos enfrentando uma intensificação significativa das rotas, principalmente devido à rotatividade dos garimpos ilegais em todos os países da Pan-Amazônia, além de diversas atividades ilegais relacionadas à exploração de madeira, abertura de estradas e projetos econômicos ligados a pequenas hidrelétricas. Isso cria nichos de prostituição e as rotas acabam se direcionando para a circulação entre os países da Pan-Amazônia”.
Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Sociedade e Fronteiras da UFRR e do Núcleo do Programa de Desenvolvimento da Pós-Graduação (PDPG – Amazônia Legal/CAPES), e autora de livros como o “Tráfico de Mulheres na Amazônia”, a professora Márcia Oliveira prosseguiu afirmando que a Amazônia brasileira é uma espécie de referência e continua sendo uma das regiões com as maiores rotas, o que inicia um processo de rotatividade com os países vizinhos.

“Além da exploração de natureza sexual, também encontramos diversas situações de trabalho análogo à escravidão, especialmente nos últimos anos, muitas envolvendo povos indígenas”, afirmou a professora.

E outro viés importante do tráfico de pessoas é o que visa ao trabalho análogo à escravidão, salientou o o defensor público no Estado do Amazonas, Messi Elmer Vasconcelos Castro, doutor em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais e mestre em Segurança Pública, Cidadania e Direitos Humanos pela Universidade do Estado do Amazonas (UEA).

”é necessário esforços estatais que sejam voltados para o empoderamento da vítima, principalmente porque, diante de um quadro de grande desinformação ou de grande vulnerabilidade, não é uma situação rara uma determinada vítima voltar a se colocar numa situação de vulnerabilidade para ser traficada novamente, especialmente se ela não tiver acesso às políticas públicas necessárias”, destacou Messi Elmer. O defensor público acrescentou que os estudiosos do tema elencam pelo menos três políticas de longo prazo que têm comprovadamente a capacidade de reduzir as chances de uma pessoa entrar numa situação de tráfico, que são: o acesso a serviços de saúde; o acesso à justiça de forma integral e à moradia.

Mediadora da Tribuna, a juíza do TJAM Anagali Marcon Bertazzo declarou que a realização da Tribuna Jurídica sobre o tráfico de pessoas é de extrema importância, pois é uma determinação do CNJ, em parceria com a Organização Internacional para as Migrações da ONU, que está promovendo pesquisas sobre o tráfico internacional de pessoas no Brasil. “Esse assunto é uma questão de política pública e é necessário que voltemos nossa atenção para ele, uma vez que é um crime no qual muitas vezes a vítima não se identifica como uma pessoa traficada. A discussão promovida no âmbito do ‘Tribuna Jurídica’ é essencial para trazer visibilidade a essa problemática, permitindo que as vítimas busquem a justiça e tenham conhecimento de que ela será feita, e que aqueles que as traficaram receberão uma pena por seus atos”.

O que é tráfico de pessoas

A Organização das Nações Unidas (ONU), no Protocolo de Palermo (2003), define tráfico de pessoas como “o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo-se à ameaça ou ao uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração”.

Segundo a ONU, o tráfico de pessoas movimenta anualmente 32 bilhões de dólares em todo o mundo. Desse valor, 85% provêm da exploração sexual.

Em 2021, o Ministério da Justiça divulgou diagnóstico sobre o tráfico de pessoas no Brasil, relativos a dados de 2017 a 2020. Outras publicações sobre o tema estão disponíveis em http://www.justica.gov.br/sua-protecao/trafico-de-pessoas/publicacoes.


Assista à integra do evento:
https://www.youtube.com/watch?v=9sfCRAvjKhg


#PraTodosVerem – a foto que ilustra a matéria mostra o auditório do TJAM durante a realização da Tribuna Jurídica. No palco, os palestrantes estão sentados, de frente para as pessoas que formam a plateia.


Ramiro Neto – Núcleo de Divulgação da Esmam 

Fonte: Conselho Nacional de Justiça – CNJ

Fotos: Chico Batata

Compartilhe este arquivo