Da Agência STJ (Supremo Tribunal de Justiça)
BRASÍLIA – O STJ afastou a responsabilidade de uma fundação educacional pelo pagamento de bolsas de estudos a um grupo de estudantes no período entre o descadastramento deles de programa de residência médica oferecido pela instituição e a inclusão do grupo em outro programa.
Para a Terceira Turma, entre outros fundamentos, a resolução da CNRM (Comissão Nacional de Residência Médica) que previa essa responsabilidade à instituição removida do programa de residência criou obrigação não prevista em lei.
Segundo os autos, o hospital passou por dificuldades e resultou em decreto de intervenção judicial, além do afastamento da instituição estudantil da administração.
Diante da situação, os alunos foram transferidos para programa de residência ofertado por outro hospital, mas deixaram de receber o valor da bolsa no período compreendido entre a desvinculação da fundação e a transferência definitiva para outro local, o que causou na ação de cobrança dos valores supostamente devidos e pedido de condenação por danos morais.
O pedido dos alunos foi acolhido na primeira instância, com fundamento na Resolução 1/2018 do CNRM. Segundo a resolução, no caso de descredenciamento ou de solicitação de cancelamento da autorização de programa de residência médica ou da instituição, a entidade de origem será responsável pelo pagamento da bolsa do médico residente, integralmente, até a conclusão do programa.
Ao STJ, a fundação argumentou que houve violação ao artigo 3º da Lei 6.932/1981, pois não há nenhuma previsão legal de que a instituição responsável pelo programa de residência deva continuar pagando a bolsa após o descredenciamento dos estudantes, pois eles não estão mais sob a sua responsabilidade.
A instituição sustentou, ainda, que a CNRM extrapolou de sua competência imputar ao organizador da residência médica tal encargo.
Resolução não pode inovar no ordenamento jurídico
A ministra Nancy Andrighi lembrou que um dos poderes atribuídos à administração pública consiste no poder regulamentar, o qual é exercido pelo chefe do Poder Executivo e consiste em editar normas para dar fiel execução às leis.
Ela pontuou que essa não é a única forma de manifestação do poder normativo da administração, que também compreende a edição de outros atos normativos, como é o caso das resoluções.
Porém, a relatora destacou que, em quaisquer dessas hipóteses, a norma não pode inovar no ordenamento jurídico, como fez a resolução da CNRM ao criar obrigação não prevista na que dispõe sobre as atividades do médico residente.
Nancy Andrighi ponderou que essa mesma previsão imposta à instituição da qual foi desvinculado o médico residente estava contida no artigo 38 da Resolução 4/2002, cuja legalidade foi examinada pela Quarta Turma no julgamento do RMS 26.889, ocasião em que o colegiado concluiu pela impossibilidade da cobrança.
Posição não viola princípio da deferência administrativa
Além disso, a ministra salientou que o entendimento não acarreta descumprimento do princípio da deferência administrativa, o qual a impõe ao Poder Judiciário o respeito às decisões tomadas por órgãos ou entidades que tenham caráter eminentemente técnico.
“A responsabilidade pelo pagamento da bolsa ao residente de medicina no período compreendido entre o seu descadastramento da instituição original e o cadastramento em novo programa de residência, não tem conteúdo técnico. Não se cogita de aplicação do princípio da deferência administrativa”, concluiu a ministra.